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Descuido ou poesia


Há dias venho me enterrando, enterrando a pessoa em mim que escreve. Ela sumira, e eu a procuro chorando, como uma viúva chora no leito de seu falecido por não saber o que fazer com a ausência, por não saber onde colocar esta intrometida, quase nunca chamada ou anunciada, mas que chega a passos finos, e de repente senta no melhor lugar do sofá, desmarca a página do livro, e te deixa café frio. Cadê a pessoa em mim que escreve ? Somou-se a ausência, deitou em seu peito terno e ao som do Blues deixou-se levar. E eu num sábado, com tantas coisas para fazer, tiro um tempo para chorar com as viúvas, pela pessoa em mim que escrevia, mas foi sorrateiramente, é uma lástima. Eu suplico-a que volte. Este não é mais um texto de amor, ou uma carta de desesperada saudade, é um último suspiro, aquele mais cansado, pois então volte pessoa, volte. As letras sempre dançaram muito próximas de mim e seu cheiro de Mirra me fazia ama-las, mas sem essa tal pessoa que escreve, não consigo ao menos organizar coerentemente o nome que um dia me deram. Talvez tenha feito a mala por por causa da monotonia diária, ou por ser tão diferente de mim, embora ainda sendo eu ,mas saiu pisando firme, e bateu a porta, sem haver sequer uma briga, sem soltar um "pio" sem nenhum manuscrito nem nada, e foi, vestida de amarelo com pouca coisa em mãos. Minh'alma continua aqui, passando pelos seus perrengues sem saber ao menos como livrar-se deles, pois é analfabeta e só sabe sentir. Ela sentia e a pessoa escrevia. Creio que quando tudo aqui estiver no mais puro caos, e a máquina transbordando de roupas sujas, ela deva voltar pra lavar tudo, e quem sabe um dia por descuido ou poesia ela goste de ficar.

Para a pessoa que em mim escreve, ou que escreve em mim, ah tanto faz ! 

Um comentário:

Unknown disse...

Que texto mais perfeito ❤
não Existe coisa melhor do que ler um texto que te descreve, parabéns Andreza .

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